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Mobilidade Humana e Coronavírus: Por que pesquisar a pandemia de COVID-19 no Museu da Imigração?
Com a reabertura de 2014, o Museu da Imigração tem assumido, cada vez mais, o desafio de trabalhar com as migrações contemporâneas. Desde a última reforma do antigo edifício da Hospedaria de Imigrantes do Brás, terminada nesse ano, vem se consolidando um plano museológico que coloca no centro o fenômeno migratório como experiência, independente de seu recorte histórico ou geográfico.
As ações de pesquisa, trabalho educativo e comunicação, portanto, passaram também a incorporar, de maneira mais direta, questões surgidas no intercâmbio com migrantes internacionais na atualidade. Sem a pretensão de dar conta de todos esses anos de atuação, seria possível listar algumas temáticas desenvolvidas, como a da luta política por direitos no país de destino, as questões de gênero, as vivências nos espaços de acolhida, os deslocamentos forçados e a arte como um meio de ação migrante. O trabalho junto aos agentes da temática migratória na atualidade se torna, assim, estratégico, na medida em que dá prosseguimento à construção coletiva da memória sobre as migrações em São Paulo, incorporando as experiências imersas na contemporaneidade.
Há, porém, um aspecto que poderia passar desapercebido, que diz respeito à importância do trabalho contínuo de pesquisa em instituições museológicas – como é o caso do Museu da Imigração. Já é de senso comum que olhamos para o passado a partir das problemáticas do presente. Com isso, queremos dizer que o que podemos saber do passado depende muito das perguntas que somos capazes de fazer desde a vivência e os conhecimentos adquiridos no presente. Seria, inclusive, possível afirmar que quanto mais se estuda e se pesquisa, mais perguntas diferentes sobre o passado somos capazes de levantar. As questões decorrentes do momento histórico em que vivemos, portanto, são mediadas por métodos de pesquisa desenvolvidos em variados campos do saber, dando acesso a novas informações, que, por sua vez, incidem sobre a memória.
Isso ficou evidenciado no curso recentemente realizado pelo Museu, "A Hospedaria de Imigrantes e os tijolos do racismo estrutural no Brasil". Em diálogo com as intensas mobilizações sociais dos movimentos negros no Brasil e no mundo em 2020, as aulas ministradas nessa programação nos proporcionaram a possibilidade de gerar novas perguntas: qual o impacto da política de branqueamento para a construção da antiga Hospedaria do Brás? Como foram as migrações negras no pós-abolição? Qual o papel da mestiçagem como ideologia nacional para o modo como conhecemos o fenômeno migratório? O que se descobre dessas perguntas, irremediavelmente, altera nosso olhar sobre o que sabíamos das migrações do passado, gerando a necessidade de novas buscas por evidências sobre essa parte que desconhecíamos dos deslocamentos humanos.
E o que acontece quando o mundo inteiro vivencia uma situação de pandemia, em que a própria mobilidade das pessoas é diretamente afetada? Primeiro, novas perguntas são lançadas, guiando uma nova busca sobre o passado das migrações, plasmada na série "Hospedaria em Quarentena", publicada também aqui no blog. Por outro lado, a novidade da situação pandêmica gera a necessidade de entendermos como será possível daqui em diante prosseguir no trabalho de construção das memórias migrantes, lançando-nos em uma nova pesquisa a partir do intercâmbio com quem vivencia essa situação e, também, quem pesquisa as mobilidades humanas na atualidade.
Foi nesse sentido que, durante todo o ano de 2020, a série "Mobilidade Humana e Coronavírus" buscou acompanhar os desdobramentos da pandemia, não só coletando os relatos e as experiências que irão compor a memória desse momento pandêmico no futuro, mas também buscando em contribuições de migrantes e pesquisadores as chaves fundamentais para compreendermos qual tipo de memória sobre os deslocamentos que se abre a partir desse momento de crise.
Em 2021, o projeto segue e teremos como primeira sequência de contribuições os artigos apresentados no site da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS), em "Boletim Cientistas Sociais e o Coronavírus". Trata-se de uma série de publicações feitas ano passado, com a contribuição de cientistas sociais, geógrafos, economistas, linguistas e historiadores. Para essa parceria inédita, contamos com uma seleção de conteúdos que tratam diretamente de questões vinculadas às mobilidades humanas.
Para conhecer essas e outras postagens, é possível acessar os textos originais site da ANPOCS, assim como baixar gratuitamente o E-Book com a compilação de todos os materiais.
Boa leitura!