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Exposição “Da cabeça aos pés”
Acessórios são utilizados por homens e mulheres em seu vestuário nas mais diversas culturas. E você? Que objetos desse tipo carrega consigo hoje? Por que escolheu estes, e não outros? Tem algum especial que fica em casa guardado?
As respostas a essas perguntas não são tão simples quanto parecem, já que essa espécie de artefato possui as mais diversas dimensões simbólicas. Superando a condição de adereços, tais objetos podem funcionar como mediadores de relações humanas e refletir práticas sociais, configurando-se, no limite, como símbolos de pertencimento e identificação de um indivíduo com uma determinada comunidade ou grupo social. Ao mesmo tempo que muitos deles acompanharam seu dono em suas jornadas, como receptáculos de vivências passadas, outros demarcaram sua chegada, sua adaptação a uma nova sociedade, bem como a construção e afirmação de uma identidade e de suas memórias. Antes mesmo da linguagem e da fala, o modo de se vestir e ornar conecta o individual ao coletivo, cria proximidades e afastamentos, desempenhando um importante papel subjetivo nas sociedades.
A própria escolha entre usar e não usar um item como esses é reveladora, já que se trata de algo acessório, e, por definição, possivelmente dispensável. E é justamente esse caráter que torna tais objetos preciosos para o estudo das histórias particulares dentro dos movimentos migratórios: se são supostamente dispensáveis, que elementos teriam sido determinantes para que tal objeto, dentre tantos, tenha sido escolhido pelo migrante para ser utilizado, guardado, levado na bagagem?
Com a abertura ao público marcada para este sábado, 2 de dezembro, a partir das 11 horas, a exposição “Da cabeça aos pés” apresenta essas peças em sua polissemia, ou seja, evidenciando os múltiplos significados que podem adquirir no contexto da história dos deslocamentos humanos, tornando-se símbolos das mais diversas formas de pertencimento e identidade. Possíveis habitantes de uma vitrine em outros espaços ou outros tempos, esses objetos saíram das lojas e das ruas para habitar corpos humanos, vestindo-se eles mesmos de novas conotações com suas histórias e usos. Aqui, são ressignificados e voltam à vitrine – desta vez, no espaço do Museu.
Vestindo a exposição
As tipologias correspondentes aos acessórios já são trabalhadas há algum tempo pelas equipes de preservação e pesquisa do Museu da Imigração. Possuímos em nosso acervo uma grande quantidade de objetos como luvas, chapéus, óculos, gravatas, joias etc., doados por migrantes de outros locais do Brasil e do mundo e por seus descendentes. São peças que se relacionam com a circulação de pessoas, materiais, modismos e costumes, e por isso tornam-se parte do que entendemos como “patrimônio das migrações”.
Para enriquecer a discussão, foi realizada uma chamada pelas redes sociais para que migrantes e seus descendentes– tanto de outras regiões do Brasil quanto de outros países – participassem do projeto, emprestando objetos e contando suas histórias, lançando mão do modelo de exposição colaborativa que vem sendo estimulado pelo Museu; dessa vez, nos esforçamos para representar também movimentos migratórios mais recentes, como sul-americanos, realizando uma convocação mais direta e pessoal.
Dessa forma, foi possível compreender essas peças pelo viés da afetividade, que nos é tão caro, por meio de vínculos reais entre processos migratórios e artefatos repletos de memórias. Esse tipo de participação nos ajuda a estabelecer novos diálogos e leituras com nosso acervo, tornando possíveis processos de ressignificação da coleção. Trazidos do local de origem, enviados por parentes distantes ou adquiridos como lembrança: esses objetos têm histórias particulares que conectam culturas, identidades e pessoas.
Ao nos debruçarmos sobre esse conjunto de itens, definimos três categorias centrais que abarcam os principais modos de usá-los: "Acessórios de corpo", ou seja, aqueles utilizados diretamente sobre a pele; "Acessórios de roupa", aqueles usado sobre outras peças; e "Acessórios portáveis", aqueles carregados nas mãos. Dentro dessas três categorias, discutiremos os usos subjetivos que tornam essas peças símbolos de identidade, auxiliando no processo de construção de uma imagem, tanto para si mesmo quanto para os outros.
Esses objetos foram ainda entendidos por meio de três camadas de significado (ou três tipos de usos subjetivos): construir-se para o mundo, lembrar-se de suas origens e conectar-se com o invisível. Esses conjuntos são interpenetráveis e evidenciam os diferentes sentidos que um mesmo tipo de objeto pode ter em contextos diferentes, propiciando um entendimento mais rico de sua polissemia.